Desenvolvimento da inteligência na infância: A emergência da diferenciação cognitiva e o seu impacto no percurso escolar

Abstract

A definição de inteligência, a sua avaliação e a sua diferenciação ao longo do ciclo de vida dos indivíduos têm dominado a história da investigação psicológica na área, tornando-se numa das dimensões mais estudadas e, ao mesmo tempo, uma das mais polémicas. Uma das questões mais antigas que permanece sem resposta linear é se a inteligência pode ser melhor definida como um fator geral ou como conjunto de habilidades cognitivas diferenciadas, podendo estas serem entendidas como autónomas ou, então, correlacionadas e interdependentes segundo níveis hierárquicos de maior ou menor generalização. Aceitando a relevância das habilidades cognitivas na explicação dos níveis de aprendizagem e de (in)sucesso escolar dos alunos, importa clarificar os padrões do seu desenvolvimento de forma a melhor orientar as práticas no contexto educativo. Assim, com esta tese, redigida na base da compilação de artigos, procurou-se descrever o perfil das habilidades cognitivas num grupo de crianças com 5, 7 e 9 anos (N=470). Os resultados obtidos na Escala de Competências Cognitivas para Crianças dos 4 aos 10 anos (ECCOs 4/10) demonstram que, nesta faixa etária, o fator geral da inteligência ainda assume um papel preponderante na explicação da estrutura cognitiva havendo, no entanto, espaço para alguma diferenciação encontrada, fundamentalmente em função do conteúdo verbal e não-verbal das tarefas. A organização das habilidades cognitivas pareceu melhor representada por um modelo hierárquico, definindo-se um fator de 2.ª ordem com base nas elevadas correlações verificadas entre os fatores primários. Por sua vez, a hipótese da diferenciação cognitiva progressiva com a idade não foi confirmada neste estudo tendo em conta a invariância observada da estrutura cognitiva ao longo dos três grupos etários, podendo esta especialização das habilidades cognitivas ser remetida para idades mais avançadas em função de experiências e de interesses mais diferenciados a partir da adolescência. Por último, os nossos resultados mostraram que o impacto de variáveis não cognitivas foi muito reduzido na explicação do desempenho cognitivo das crianças, com a exceção do tamanho da fratria que assumiu alguma relevância. De uma forma geral, este estudo possibilitou uma leitura renovada acerca da organização das habilidades cognitivas na infância, sugerindo novos cuidados na forma de avaliar a inteligência por parte dos psicólogos.

The definition of intelligence, its evaluation and its differentiation throughout individuals’ life span have dominated the history of psychological investigation in this area, becoming one of the most studied dimensions and, at the same time, one of the most controversial. One of the oldest questions that remain without a linear response is whether intelligence can be better defined as a general factor or as a set of differentiated cognitive abilities that can be understood as autonomous or correlated and interdependent according to hierarchical levels of greater or lesser generalization. Accepting the relevance of the cognitive abilities in the explanation of the levels of learning and students’ academic success or failure, it is important to clarify the patterns of their development in order to better guide the practice in the educational context. Thus, with this thesis, elaborated from the compilation of published papers, we tried to describe the profile of cognitive abilities in a group of children with ages of 5, 7 and 9 (N = 470). The main results, obtained in the Cognitive Competencies Scale for Children from 4 to 10 years (ECCOs 4/10) show that, in this age group, the general intelligence factor still assumes a preponderant role in the explanation of the cognitive structure. However, there is space for some differentiation found through the verbal and non-verbal content of the tasks. The organization of cognitive abilities seemed better defined by a hierarchical model, defining a second-order factor based on the high correlations between primary factors. On the other hand, the cognitive age differentiation hypothesis was not confirmed in this study considering the observed invariance of the cognitive structure throughout the three age groups. It is possible that this specialization of the cognitive abilities occur in more advanced ages in function of learning experiences, interests and motivations more differentiated from the adolescence. Finally, our results showed that the impact of non-cognitive variables on the explanation of children's cognitive performance was small, with the exception of the sibship size that assumed some relevance. In general, this study contributes to a renewed reading about the organization of the cognitive abilities in childhood, suggesting new concerns in the assessment of intelligence by psychologists.